PROPOSTAS PARA FORMULAÇÃODE POLÍTICA DELEITURA EINFORMAÇÃO PARA AS BIBLIOTECAS PÚBLICAS MUNICIPAIS DA CIDADE DE SÃO PAULO

Elaborado pelo Grupo de Trabalho – Bibliotecas


Documento a ser encaminhado para todos os candidatos à eleição 2020 A literatura confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas.

(Antonio Candido, 1989, p. 113)

Numa perspectiva positiva, São Paulo é uma cidade múltipla e, portanto, com potencial para o afloramento da diversidade cultural que comporta. Ocorre, no entanto, que uma outra das suas facetas é a das diferenças de oportunidades que também proporciona. Assim, observa-se em seu território que há diferentes condições de acesso e uma significativa desigualdade de distribuição dos recursos pelas sucessivas administrações cuja orientação quase sempre se traduz na decisão de continuidade ou de aprofundamento da desigualdade nas referidas condições de acesso aos bens materiais, serviços, estrutura pública, entre outros. Como não poderia deixar de ser, isto também ocorre quanto aos equipamentos, serviços, a oferta de bens simbólicos e atividades relacionadas à cultura.

São Paulo, além de ser uma cidade múltipla em termos de oportunidades e de recursos, precisa também atuar numa perspectiva democrática de distribuição dos referidos recursos destinados aos equipamentos existentes em todo o território porque respeito e compromisso social devem se traduzir em oferta equivalente de oportunidades de expressão e conhecimento, atuando numa perspectiva de reversão da desigualdade de tratamento e oportunidade no uso do dinheiro público.


É por esta razão que os bibliotecários municipais filiados à Anis – Associação dos Servidores do Nível Superior da Prefeitura do Município de São Paulo decidiram compor um grupo de trabalho para levantar as questões da área, encontrar soluções e propor estratégias para alteração deste modus operandi da Secretaria Municipal de Cultura quanto ao conjunto das Bibliotecas Municipais, conjunto este que representa a maior parcela dos equipamentos da pasta e com o maior capilaridade no território da Cidade, contraditoriamente com a menos significativa destinação de parcela orçamentária proporcional.

Compõem este conjunto as Bibliotecas Metroplitanas (BMA, BML e CCSP), as Bibliotecas que compõem o CSMB (Sistema Municipal de Bibliotecas), o serviço de Ônibus-Biblioteca, as Bibliotecas Públicas Especializadas, os Centros de Documentação. Há ainda as Bibliotecas dos CEUs, estas com característica híbrida atendem tanto a comunidade escolar dos Centros de Educação Unificados quanto a comunidade do entorno e fazem parte da Secretaria Municipal de Educação, ainda que articuladas à Rede de Bibliotecas. Há também os Pontos de Leitura.

A insuficiência crônica de recursos concorre para o esvaziamento das práticas, inviabiliza, compromete a qualidade e continuidade de serviços e ações de cultura, assim como precariza as condições e relações de trabalho. Isto sem contar o fantasma neoliberal da privatização das instituições públicas que espreita bem de perto o setor.

Tal circunstância reflete na prática uma opção bastante clara pela política de eventos ao modo da cultura de massa de influência neoliberal na esfera pública e de uma perspectiva domesticatória de cultura na qual predomina a oferta de produções na linha da sociedade do espetáculo que, direta ou indiretamente, concorrem para a apatia do cidadão.

Defendemos a proposição e realização de uma política de leitura e informação pública que atue na perspectiva do encorpamento do tecido crítico do público leitor e de fomento das suas capacidades de fruição, de elaboração, de expressão e comunicação e, como consequência, de empoderamento e ocupação do local de fala e de decisão, de autonomia e de emancipação. Leitura e informação pública a serviço de uma qualidade de vida melhor e do fomento das interações humanas significativas. E, como afirmava o sociólogo e crítico literário Antonio Candido, a leitura deveria ser colocada na categoria dos direitos humanos porque a literatura confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas.

Nesta perspectiva, o acesso às produções simbólicas e ao conhecimento cumprem um lugar fundamental para transformação da sociedade que deve ocorrer para e com a participação desta. Trata-se de fazer aflorar a potencialidade que o cidadão tem de, inserido no contexto sociocultural, ocupar o lugar de protagonista das suas escolhas e voz das suas expressões.

E como se trabalhar numa perspectiva de leitura e informação que seja democrática e libertadora? Precisamos de um olhar para as bibliotecas como um espaço de fruição de cultura e cidadania, superando a noção de mero acesso e promoção de eventos que favorecem o entretenimento, mas podem ser esvaziados de sentido.

Os espaços também exigem um olhar não somente de cuidado e preservação, embora também isso, como igualmente de acolhimento e ocupação. A beleza e a qualidade não são somente prerrogativas de uma parcela abastada e inserida socioculturalmente. O acesso à leitura e à informação deve ser tomado como direito e presume olhar o público leitor numa perspectiva da sua capacidade de transformação a partir daquilo que frui e daquilo que expressa através de atitudes e posicionamentos e, neste sentido, a capacidade de tessitura crítica do público não deve ser subestimada com a oferta de bens culturais necessariamente de fácil assimilação porque tal perspectiva encontra-se contaminada de preconceito e mascara, direta ou indiretamente, um interesse de dominação.

A alteração de perspectiva de trabalho demanda:

  1. A revitalização física e reorientação das práticas e serviços ofertados.
  2. Alteração na dinâmica da relação com o público, colocando em destaque a experiência cultural de cada um e a sua potencialidade e contribuição sociocultural.
  3. Criação de ambiente favorável a ocorrência de trocas simbólicas por meio do debate, da ocupação do espaço pelo público, de superação da noção de biblioteca como ambiente somente de acesso e a transformando num local de articuladora de reflexões.
  4. Oferecer programações culturais adequadas à natureza da instituição como cursos, palestras, debates, exibição de vídeos, apresentações teatrais e musicais que promovam a participação dos leitores, tanto como ouvintes como também produtores culturais.
  5. Realização de programas de leitura e outros que incentivem uma formação reflexiva e cidadã.
  6. Garantia de continuidade de atividades e serviços com a recomposição das equipes de trabalho por meio de concurso público e nomeação de profissionais para ocupar as vagas decorrentes da aposentadoria de mais da metade dos servidores de Bibliotecas nos últimos anos, sem a equivalente reposição. Definir e assegurar um quadro mínimo de pessoal conforme o porte (pequeno, médio e grande, metropolitanas) de cada Biblioteca.
  7. Formação continuada dos profissionais para atuação numa perspectiva de gestão participativa.
  8. Respeito a expertise dos profissionais bibliotecários no que concerne à gestão de bibliotecas, formulação de políticas, proposição de projetos, mediação qualificada de leitura e informação, tratamento de acervos, entre outros.
  9. Reativação da Rede de Leitura no sentido de conectar, expandir, incluir, dar condição de significar e ressignificar os serviços e as ações de cultura com a valorização dos atores culturais e em contribuição para constituição de uma sociedade leitora.
  10. Assegurar a continuidade de serviços, atividades e renovação dos acervos com a destinação equivalente de verbas. Leitura e informação públicas também são obrigações de Estado e não podem ficar sujeitas ao voluntarismo de administrações que não assumem sua responsabilidade com o fomento das Bibliotecas.
  11. Fazer valer na prática os princípios contidos no Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca (PMLLLB) de São Paulo.
  12. Utilização da tecnologia digital para desenvolvimento de ações de leitura e informação e, também, os mecanismos de divulgação do seu marketing cultural.

Por fim, reafirmamos a noção de serviços e atividades culturais de qualidade como direito social e condição de empoderamento daqueles que se encontram em situação de desigualdade e “também” daqueles que já se encontram inseridos no circuito sociocultural. É urgente fazer valer aquela máxima de que não se trata igualmente os desiguais porque tal opção na realidade significa no mínimo a manutenção da desigualdade e, na maioria das vezes, o seu aprofundamento. Cultura não deve ser privilégio de apenas uma parcela ou setor da sociedade.

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